sábado, 10 de janeiro de 2015

No reino das borboletas





À beira de um charco, formosa borboleta, fulgurando ao crepúsculo, pousou  sobre um ninho de larvas e falou para as pequenas lagartas, confusas: 
Não temam! Sou sua irmã de raça! 
Venho para lhes trazer esperança. Nem sempre permanecerão coladas às  ervas do pântano! Tenham calma, fortaleza e paciência.  Esforcem-se para não sucumbir aos golpes da ventania que, de quando em  quando, varre a paisagem. 
Esperem! Depois do sono que as aguarda, todas acordarão com asas de puro  veludo, refletindo o esplendor solar...
Então, não mais se arrastarão, presas ao solo úmido e triste. Adquirirão  preciosa visão da vida, pois poderão subir muito alto e seu alimento será o  néctar das flores... 
Viajarão deslumbradas, contemplando o mundo, sob novo prisma!  Observarão o sapo que nos persegue, castigado pela serpente que o destrói,  e verão a serpente que fascina o sapo, fustigada pelas armas do homem. 
Enquanto a mensageira fez ligeira pausa, ouviam-se exclamações admiradas:  Ah, não posso crer no que vejo!
Que misteriosa criatura! Será uma fada milagrosa?
Nada possui de comum conosco... Irradiando o suave aroma do jardim de onde viera, a linda visitante sorriu e  continuou: 
Não se iludam! Não sou uma fada celeste! Minhas asas são parte integrante da nova forma que a natureza lhes reserva.  Ontem, eu vivia com vocês; amanhã viverão comigo! Flutuarão no imenso  espaço, em voos sublimes em plena luz. Libertas do lodaçal, se elevarão  felizes. 
Conhecerão a beleza das copas floridas e o saboroso néctar das pétalas  perfumadas. Contemplarão a altura e a amplitude do firmamento...  Logo após, lançando carinhoso olhar à família alvoroçada, distendeu as asas  coloridas e, voando com graciosidade, desapareceu no infinito azul. 
Nisso, chegou ao ninho a lagarta mais velha do grupo, que estava ausente, e,  ouvindo os comentários empolgados das companheiras mais jovens, ordenou irritada:  Calem-se e escutem! Tudo isso é insensatez, mentiras, divagações... 
Não nos iludamos! Nunca teremos asas! Ninguém deve filosofar...  Somos lagartas, nada mais que lagartas. Sejamos práticas, no imediatismo da  própria vida. Esqueçam-se de pretensos seres alados que não existem. 
Precisamos simplesmente comer e comer... Depois vem o sono, a morte... E o  nada... Nada mais...  As lagartas calaram-se, desencantadas.  Caiu a noite e, em meio à sombra, a lagarta-chefe adormeceu, sem despertar  no outro dia. Estava completamente imóvel. 
As irmãs, preocupadas, observavam curiosas o fenômeno...
Depois de algum tempo, para espanto de todas, a ignorante e descrente  orientadora surgiu como veludosa borboleta, de asas leves e ligeiras, a bailar no ar... 

Rivalcir Liberato

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